Voltar ao Evangelho, voltando aos pobres
A eleição de Jorge Mário Bergoglio como bispo de Roma marca uma nova etapa na vida da Igreja que bem pode ser caracterizada como um apelo a voltar ao Evangelho de Jesus de Nazaré. A escolha do nome Francisco já indica um projeto de vida, de Igreja e de ministério pastoral: simplicidade e austeridade, cuidado dos pobres e da casa comum, busca e construção da paz. E isso foi se concretizando ao longo desses 10 anos em seu modo de vida, em suas catequeses e homilias, em seus discursos e documentos, em suas viagens apostólicas, em seus encontros ecumênicos e inter-religiosos, em sua atuação política e em seus encontros com os movimentos populares, bem como em seu empenho por uma conversão missionário-sinodal da Igreja. Em tudo isso transparece o “frescor original do Evangelho”, em cujo centro está a misericórdia de Deus para a humanidade sofredora que põe a Igreja em permanente “saída para as periferias”.
Embora se possa falar de muitas coisas nesses 10 anos de Francisco, há um ponto que se destaca e que pode ser tomado como a marca fundamental de seu ministério pastoral: a centralidade dos pobres e marginalizados na vida e missão da Igreja.
É claro que Francisco está preocupado com a vida interna da Igreja: clericalismo, tradicionalismo, rigorismo, devocionismo estéril etc. Mas insiste que a Igreja só se renova na missão de “tornar o Reino de Deus presente no mundo”, em cujo centro estão os pobres e marginalizados e as necessidades da humanidade sofredora. Daí sua insistência na urgência de uma “conversão missionária” da Igreja como “saída para as periferias”.
E é claro que Francisco está preocupado com os grandes problemas da sociedade: crise socioambiental, conflitos e guerras, cultura do descarte, economia que mata etc. Mas insiste que esses problemas todos só podem ser compreendidos e enfrentados a partir das periferias geográficas, sociais e existenciais. Por isso, sempre aborda os grandes problemas a partir de suas vítimas (luz, horizonte) e valoriza tanto a resistência e a criatividade dos pobres (sabedoria popular, alternativas, movimentos populares).
Essa centralidade dos pobres e marginalizados na vida e missão da Igreja é uma exigência que brota do Evangelho de Jesus Cristo e que prolonga e atualiza no mundo o mistério da encarnação. Por isso, Francisco não se cansa de recordar e insistir no caráter salvífico-espiritual da “opção preferencial pelos pobres”. Isso faz das periferias um lugar teológico privilegiado e central: “Todo o caminho da nossa redenção está assinalado pelos pobres”; “o caminho de Jesus começou na periferia, vai dos pobres e com os pobres para todos”; “quando Deus quis regenerar a criação, quis ir à periferia: aos lugares de pecado e de miséria, de exclusão e sofrimento, de doença e solidão, porque eram também lugares cheios de possibilidades”; “a Igreja nasceu na periferia da Cruz, onde se encontram tantos crucificados. Se a Igreja se desentende dos pobres, deixa de ser a Igreja de Jesus”; “o caminho das periferias geográficas e existenciais é o caminho da encarnação: Deus escolheu a periferia para revelar, em Jesus, sua ação salvadora na história”.
A importância maior de Francisco para a Igreja e o mundo consiste precisamente em seu apelo e empenho para a Igreja voltar ao Evangelho de Jesus, voltando-se para os pobres e marginalizados desse mundo. Francisco devolve o Evangelho à Igreja, devolvendo a Igreja aos pobres. Faz com que o Evangelho de Jesus Cristo apareça de novo como Boa Notícia para a humanidade sofredora. Isso mostra que Francisco não é apenas o nome de um papa, mas uma “forma de vida com sabor do Evangelho”; e que A alegria do Evangelho não é apenas o título de um documento papal, mas expressão de uma Igreja que é “mãe de coração aberto”, “lugar da misericórdia”, “hospital de campanha”. Essa é sem dúvida a herança espiritual maior de Francisco para a Igreja e o mundo. E nisso faz jus ao nome que carrega…
Bendito seja Deus por Francisco: Um bom pastor com cheiro de ovelhas, um pastor com cheiro do Evangelho…